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quinta-feira, 18 de junho de 2020

Jorge Luis Borges (Argentina: 1899 – 1986)




O Alquimista


Lento na aurora um jovem exaurido
Pela delongada reflexão e as avaras
Vigílias considera ensimesmado
Os insones braseiros e alquitarras. [1]

Entende que o ouro, esse Proteu, espreita [2]
Por qualquer acaso, como o destino;
Entende que está no pó do caminho,
e também no arco, no braço e na seta.

Em sua dúbia visão de um ser secreto
Que se dissimula no astro e no lodo,
Pulsa aquele outro sonho de que tudo
É água, como viu Tales de Mileto [3].

Outra visão haverá; a de um eterno
Deus cuja ubíqua face é cada coisa,
Como dirá o geômetra Espinosa [4]
Num livro mais intrincado que o Averno... [5]

Nos extensos confins orientais
Do azul empalidecem os planetas,
O alquimista considera as secretas
Leis que juntam planetas e metais.

E entrementes crê tocar exaltado
O ouro, aquele que destruirá a Morte.
Deus, que sabe de alquimia, o converte
Em pó, em ninguém, em nada e em olvido.


El Alquimista


Lento en el alba un joven que han gastado
La larga reflexión y las avaras
Vigilias considera ensimismado
Los insomnes braseros y alquitaras.

Sabe que el oro, ese Proteo, acecha
Bajo cualquier azar, como el destino;
Sabe que está en el polvo del camino,
En el arco, en el brazo y en la flecha.

En su oscura visión de un ser secreto
Que se oculta en el astro y en el lodo,
Late aquel otro sueño de que todo
Es agua, que vio Tales de Mileto.

Otra visión habrá; la de un eterno
Dios cuya ubicua faz es cada cosa,
Que explicará el geométrico Spinoza
En un libro más arduo que el Averno...

En los vastos confines orientales
Del azul palidecen los planetas,
El alquimista piensa en las secretas
Leyes que unen planetas y metales.

Y mientras cree tocar enardecido
El oro aquél que matará la Muerte.
Dios, que sabe de alquimia, lo convierte
En polvo, en nadie, en nada y en olvido.


Notas:

[1] Aparelho de destilação sem serpentina.
[2] Na mitologia, deus marinho, filho de Poseidon e Tétis. Dotado do poder da premonição, era conhecedor dos caprichos do destino, mas não gostava de revelá-los aos humanos.
[3] Tales de Mileto: primeiro filósofo e matemático grego de que se tem notícia, para quem a água estava na origem de todas as coisas.
[4] Baruck de Espinosa, filósofo holandês, autor de "Ética Demonstrada à Maneira dos Geômetras".
[5] Averno, lago vulcânico próximo a Nápoles. Na mitologia, é a entrada para o mundo subterrâneo, governado por Plutão (Hades, na mitologia grega).



Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)

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