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terça-feira, 2 de junho de 2020

Katerína Gógou (Grécia: 1940 – 1993)




A solidão
não ostenta em seu olhar a cor entristecida
das mulheres burras apatetadas. [1]
Ela não perambula de modo abstrato e íntima satisfação
rebolando as ancas em salas de concerto
e museus congelados.
Ela não é os quadros militares covardes dos 'bons' velhos tempos
A naftalina no peito das velhinhas
As fitas róseas e chapéus de palha.
Ela não abre as pernas dando risadinhas fingidas
O olhar fixo de vaca em suspiros ritmados
e roupas íntimas de cores sortidas.

A solidão
tem a cor dos paquistaneses, essa solidão, [2]
E é avaliada metro a metro
Junto com suas coisas
Encontrada no final das filas nos sinais fechados [3]
Ela permanece pacientemente enfileirada
Bournazi – Santa Barbara – Kokkinia
Touba – Stavroupoli – Kalamaria [4]
Sob quaisquer condições climáticas
Com sua cabeça suada

Ela ejacula aos gritos e estraçalha vidraças com correntes
Ela controla os meios de produção
Ela detona a propriedade privada
Ela é uma visita domingueira na prisão
O mesmo passo no pátio revolucionários e prisioneiros penais
Ela é vendida e comprada minuto a minuto, suspiro a suspiro
Nos mercados de escravos da terra – Kotzia é logo ali [5]
Levante-se cedo
Levante-se e comprove.

Ela é uma puta nos prostíbulos
O treinamento militar alemão para recrutas
E os últimos
Infindáveis quilômetros da rodovia nacional que leva ao centro
Nas carnes interditadas da Bulgária.
E quando seu sangue se adensa e ela não consegue mais
Suportar que sua espécie seja negociada a preço tão vil
Ela dança uma zeibekiko descalça sobre as mesas [6]
Segurando em suas mãos azuis machucadas
Um bem afiado machado

A Solidão
A nossa solidão eu digo. É sobre a nossa solidão que estou falando,
É um machado em nossas mãos
Que sobre suas cabeças está girando girando girando



Loneliness
does not have the saddened color
of the cloudy bimbo in her eyes. [1]
She does not stroll abstractly and self-content
Shaking her hips in concert halls
And in frozen museums.
She is not the yellow cadres of “good” old times
And naphthalene in granny’s chests
Rosy ribbons and straw hats.
She does not open her legs with fake small laughers
A cow’s gaze rhythmic sighs
And assorted underwear.

Loneliness
Has the color of Pakistanis, this loneliness [2]
And she is counted inch by inch
Along with their pieces
In the bottom of the light-shaft. [3]
She stands patiently queuing
Bournazi – Santa Barbara – Kokkinia
Touba –Stavroupoli – Kalamaria [4]
Under all weathers
With a sweaty head

She ejaculates screaming and smashes the front windows with chains
She occupies the means of production
She blows up private property
She is a Sunday visit in prison
Same step in the yard revolutionaries and penal prisoners
She is sold and bought minute by minute, breath by breath
In the slave markets of the earth – Kotzia is near here [5]
Wake up early.
Wake up to see it.

She is a whore in the rotten-houses
The German drill for conscripts
And the last
Endless miles of the national highway towards the centre
In the suspended meats from Bulgaria.
And when her blood clots and she can take no more
Of her kind being sold so cheaply
She dances barefoot on the tables a zeibekiko [6]
Holding in her bruised blue hands
A well sharpened axe.

Loneliness,
Our loneliness I say. Its our loneliness I am speaking about,
Is a axe in our hands
That over your heads is revolving revolving revolving revolving.


Notas:

[1] Bimbo (gíria): garota pouco inteligente, super maquiada e obcecada por homens e roupas. Em geral, ela é loura.
[1] Cloudy (gíria): ligeiramente bêbado e apatetado.
[2] Os paquistaneses foram os primeiros trabalhadores imigrantes da Grécia. Em 1970 eles organizaram uma das mais violentas greves do país, num tempo em que o movimento pela autonomia dos trabalhadores estava em seu auge.
[3] Lightshaft: Quando um semáforo só muda para verde quando uma certa quantidade de carros enfileira-se a sua frente.
[4] Bairros proletários de Atenas e Salônica.
[5] Praça em que se situa a prefeitura de Atenas, onde os trabalhadores da construção civil se reuniam antes do amanhecer, para ser levados para o trabalho.

[6] Dança grega.





Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)

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