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sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Sóror Juana Inés de la Cruz (México: 1648 – 1695)

 

Finjamos que sou feliz

 

Finjamos que sou feliz,

pobre pensamento, um pouco;

e podereis convencer-me,

embora eu saiba o contrário,

 

que somente na aflição,

dizem que os males se apoiam.

Se feliz os aceitarem

não sereis tão infeliz.

 

Que me sirva o entendimento

vez por outra de descanso,

que nem sempre esteja o engenho

com o lucro associado.

 

Há no mundo opiniões

de pareceres tão vários,

que aquilo que um diz ser negro

um outro prova que é branco.

 

A um serve de atrativo

o que outro vê com enfado;

e o que este tem por alívio,

aquele tem por trabalho.

 

O que está triste censura

o alegre por leviano;

e o que está alegre zomba

ao ver o triste penando.

 

Os dois filósofos gregos                [*]

esta verdade provaram:

pois o que em um era riso,

no outro era causa de pranto.

 

Célebre, sua disputa

começou há muitos séculos,

sem que qual foi que acertou

tenha sido averiguado.

 

Foi sob as duas doutrinas

que o mundo se dividiu,

e conforme o humor varie,

cada qual segue seu bando.

 

De um lado um diz que o sorriso

no mundo só cabe a uns tantos;

do outro, que seus infortúnios

são só para os lamentados.

 

Para tudo haverá prova

e razão em que fundá-la;

e para nada há razão

de haver razão para tanto.

 

Todos são iguais juízes;

e sendo iguais e diversos,

não há quem vá decidir

qual é mais sentencioso.

 

Pois, se ninguém sentencia,

por que pensais, confundidos,

que a vós encomendou Deus

a decisão desses casos?

 

Ou por que, contra vós mesmos,

com intransigência inumana,

entre o amargo e o adocicado,

quereis escolher o amargo?

 

Se é meu todo o entendimento,

por que sempre hei de julgá-lo

tão infame para o alívio,

tão zeloso para o dano?

 

O discurso é uma espada

que se presta a dois propósitos,

dar morte por sua ponta

e proteção por seu cabo.

 

Se vós, sabendo o perigo

quereis pela ponta usá-la,

do que é acusada a espada

pelo mal uso da mão?

 

Não é saber o fazer-se

discurso sutil e vão;

pois o saber só consiste

em escolher o que é são.

 

Especular sobre o azar

e examinar os presságios,

só serve para que o mal

se avulte ao antecipá-lo.

 

Nos trabalhos que virão,

se a atenção se volatiza,

mais formidável que o risco

é simular-se amargura.

 

Quão feliz é a ignorância

de quem, falsamente sábio,

encontra sua aflição

no que não sabe, sagrado!

 

Nem sempre se alçam seguros

voos ousados do engenho,

que buscam trono no fogo

e encontram tumba no choro.

 

Também é vício o saber

que por atalhos se busca,

quanto menos se conhece

mais ruinoso é o estrago;

 

e se o seu voo não cortam,

em sutilezas nutrido,

por cuidar do que é bizarro

se esquece do necessário.

 

Se culta mão não impede

que fique a planta copada,

vão-se o sustento dos frutos

e todo o vigor dos galhos.

 

Se a ir-se a nave ligeira

não obsta o lastro pesado,

o voo tira proveito

do precipício mais alto.

 

Em amenidade inútil,

que importa o campo florido,

se não dá frutos o outono,

que exiba flores o maio?

 

Que proveito tira o engenho

do grande aumento dos partos,

se à multidão se lhe segue

a desdita de abortá-los?

 

E por força a essa desdita

há de seguir-se o fracasso

de ficar o produzido,

se não morto, lastimado.

 

O engenho é como o fogo,

que, ingrato com a matéria,

tanto mais ele a consome

quando se mostra mais culto.

 

É de seu próprio Senhor

tão rebelado vassalo,

que converte seus insultos

em armas que hão de salvá-lo.

 

Esse péssimo exercício,

esse duro afã pesado,

aos olhos de todos homens

deu-lhes Deus para treiná-los.

 

Que louca ambição nos faz

de nós mesmos esquecidos?

Se é para viver tão pouco,

de que serve saber tanto?

 

Oh, se como há de saber-se,

havia alguns seminários

ou escolas onde a ignorância

se ensinava em seus trabalhos!

 

Que muito feliz vivia

quem, com alguma prudência,

defraudasse as ameaças

das influências dos astros!

 

Aprendamos a ignorar,

pensamento, pois sabemos

que o quanto agrego ao discurso,

ao fim usurpo dos anos.

 

 

Finjamos que soy feliz

 

 

Finjamos que soy feliz,

triste pensamiento, un rato;

quizá prodréis persuadirme,

aunque yo sé lo contrario,

 

que pues sólo en la aprehensión

dicen que estriban los daños,

si os imagináis dichoso

no seréis tan desdichado.

 

Sírvame el entendimiento

alguna vez de descanso,

y no siempre esté el ingenio

con el provecho encontrado.

 

Todo el mundo es opiniones

de pareceres tan varios,

que lo que el uno que es negro

el otro prueba que es blanco.

 

A unos sirve de atractivo

lo que otro concibe enfado;

y lo que éste por alivio,

aquél tiene por trabajo.

 

El que está triste, censura

al alegre de liviano;

y el que esta alegre se burla

de ver al triste penando.

 

Los dos filósofos griegos

bien esta verdad probaron:

pues lo que en el uno risa,

causaba en el otro llanto.

 

Célebre su oposición

ha sido por siglos tantos,

sin que cuál acertó, esté

hasta agora averiguado.

 

Antes, en sus dos banderas

el mundo todo alistado,

conforme el humor le dicta,

sigue cada cual el bando.

 

Uno dice que de risa

sólo es digno el mundo vario;

y otro, que sus infortunios

son sólo para llorados.

 

Para todo se halla prueba

y razón en qué fundarlo;

y no hay razón para nada,

de haber razón para tanto.

 

Todos son iguales jueces;

y siendo iguales y varios,

no hay quien pueda decidir

cuál es lo más acertado.

 

Pues, si no hay quien lo sentencie,

¿por qué pensáis, vos, errado,

que os cometió Dios a vos

la decisión de los casos?

 

O ¿por qué, contra vos mismo,

severamente inhumano,

entre lo amargo y lo dulce,

queréis elegir lo amargo?

 

Si es mío mi entendimiento,

¿por qué siempre he de encontrarlo

tan torpe para el alivio,

tan agudo para el daño?

 

El discurso es un acero

que sirve para ambos cabos:

de dar muerte, por la punta,

por el pomo, de resguardo.

 

Si vos, sabiendo el peligro

queréis por la punta usarlo,

¿qué culpa tiene el acero

del mal uso de la mano?

 

No es saber, saber hacer

discursos sutiles, vanos;

que el saber consiste sólo

en elegir lo más sano.

 

Especular las desdichas

y examinar los presagios,

sólo sirve de que el mal

crezca con anticiparlo.

 

En los trabajos futuros,

la atención, volatizando,

más formidable que el riesgo

suele fingir el amago.

 

Qué feliz es la ignorancia

del que, indoctamente sabio,

halla de lo que padece,

en lo que ignora, sagrado!

 

No siempre suben seguros

vuelos del ingenio osados,

que buscan trono en el fuego

y hallan sepulcro en el llanto.

 

También es vicio el saber,

que si no se va atajando,

cuando menos se conoce

es más nocivo el estrago;

 

y si el vuelo no le abaten,

en sutilezas cebado,

por cuidar de lo curioso

olvida lo necesario.

 

Si culta mano no impide

crecer al árbol copado,

quita la sustancia al fruto

la locura de los ramos.

 

Si andar a nave ligera

no estorba lastre pesado,

sirve el vuelo de que sea

el precipicio más alto.

 

En amenidad inútil,

¿qué importa al florido campo,

si no halla fruto el otoño,

que ostente flores el mayo?

 

¿De qué sirve al ingenio

el producir muchos partos,

si a la multitud se sigue

el malogro de abortarlos?

 

Y a esta desdicha por fuerza

ha de seguirse el fracaso

de quedar el que produce,

si no muerto, lastimado.

 

El ingenio es como el fuego,

que, con la materia ingrato,

tanto la consume más

cuando él se ostenta más claro.

 

Es de su propio Señor

tan rebelado vasallo,

que convierte en sus ofensas

las armas de su resguardo.

 

Este pésimo ejercicio,

este duro afán pesado,

a los ojos de los hombres

dio Dios para ejercitarlos.

 

¿Qué loca ambición nos lleva

de nosotros olvidados?

Si es para vivir tan poco,

¿de qué sirve saber tanto?

 

¡Oh, si como hay de saber,

hubiera algún seminario

o escuela donde a ignorar

se enseñaran los trabajos!

 

¡Qué felizmente viviera

el que, flojamente cauto,

burlara las amenazas

del influjo de los astros!

 

Aprendamos a ignorar,

pensamiento, pues hallamos

que cuanto añado al discurso,

tanto le usurpo a los años.

 


[*] Demócrito e Heráclito.



 

Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)

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