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quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Alí Chumacero (México: 1918 – 2010)

 

A uma flor submersa

  

Cai a rosa, cai

atravessando a água,

lenta pelo cristal de sombra

em que seu talo afoga;

descendo imperceptível,

clara, sem peso, pura

e as ondas a cobrem, a desnudam,

a devolvem a seu aroma

fazem-na velejadora pela seiva

que da terra nasce

e sobe trêmula,

extravasa a ternura de seu tato

em verde aprisionado,

e por fim desabrocha em flor

como o escravo que de noite sonha

em uma luz que rompa

as origens de seu sonho,

como o desnudo cervo, quando a fonte brota,

que irriga com seu vapor a corrente

destroçando sua imagem.

Cai mais ainda, cai

mais longe sua seiva,

sobre a lápide do sepulcro,

no olhar de um canário ferido

que se atreve a um último ruflar de asas

para embrenhar-se mudo por entre as sombras.

Cai sobre minha mão

inclinando-se mais e mais ao tato,

cede a sua suavidade de manto mortuário

e como uma pálida lembrança

o anjo ansioso

perde um rastro de seu aroma,

deixa uma pegada pé que não pousa

e gesso que se apaga no silêncio.

  

A uma flor inmersa

  

Cae la rosa, cae

atravesando el agua,

lenta por el cristal de sombra

en que su tallo ahoga;

desciende imperceptible,

clara, ingrávida, pura

y las olas la cubren, la desnudan,

la vuelven a su aroma,

hácenla navegante por la savia

que de la tierra nace

y asciende temblorosa,

desborda la ternura de su tacto

en verde prisionero,

y al fin revienta en flor

como el esclavo que de noche sueña

en una luz que rompa

los orígenes de su sueño,

como el desnudo ciervo, cuando la fuente brota,

que moja con su vaho la corriente

destrozando su imagen.

Cae más aún, cae

más allá de su savia,

sobre la losa del sepulcro,

en la mirada de un canario herido

que atreve el último aletazo

para internarse mudo entre las sombras.

Cae sobre mi mano

inclinándose más y más al tacto,

cede a su suavidad de sábana mortuoria

y como un pálido recuerdo

o ángel desalado

pierde una estela de su aroma,

deja una huella pie que no se posa

y yeso que se apaga en el silencio.


Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)

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