I) Primeira versão
Crepúsculos da Cidade
(por razões que o próprio autor esclarece na segunda
parte, não me preocupei com rimas e métrica na primeira versão do poema)
Flui o tempo imortal e em seu latejo
apenas vibra estéril persistência,
surda avidez de nada, indiferença,
pulso de areia, azougue sem sentido.
apenas vibra estéril persistência,
surda avidez de nada, indiferença,
pulso de areia, azougue sem sentido.
Feitos já tempo morto e resolvido
jazem a idade, o sonho e a inocência,
punhado de aridez na consciência,
vã cifra do homem e seu gemido.
jazem a idade, o sonho e a inocência,
punhado de aridez na consciência,
vã cifra do homem e seu gemido.
Volvo o rosto: não sou senão a esteira
de mim mesmo, a ausência que deserto,
o eco do silêncio do meu grito.
de mim mesmo, a ausência que deserto,
o eco do silêncio do meu grito.
Tudo se desmorona e se congela:
do homem só perdura seu deserto,
monumento de fel, pranto, delito.
do homem só perdura seu deserto,
monumento de fel, pranto, delito.
Crepúsculos de la Ciudad
A Alí Chumacero
Fluye el tiempo inmortal y en su latido
sólo palpita estéril insistencia,
sorda avidez de nada, indiferencia,
pulso de arena, azogue sin sentido.
sólo palpita estéril insistencia,
sorda avidez de nada, indiferencia,
pulso de arena, azogue sin sentido.
Hechos ya tiempo muerto y exprimido
yacen la edad, el sueño y la inocencia,
puñado de aridez en mi conciencia,
vana cifra del hombre y su gemido.
yacen la edad, el sueño y la inocencia,
puñado de aridez en mi conciencia,
vana cifra del hombre y su gemido.
Vuelvo el rostro: no soy sino la estela
de mí mismo, la ausencia que deserto,
el eco del silencio de mi grito.
de mí mismo, la ausencia que deserto,
el eco del silencio de mi grito.
Todo se desmorona o se congela:
del hombre sólo queda su desierto,
monumento de yel, llanto, delito.
del hombre sólo queda su desierto,
monumento de yel, llanto, delito.
II) Relato do poeta
"Entreguei meus sonetos a Ali
[Chumacero] e um ou dois meses depois os vi publicados em ‘Letras de México’.
Ao lê-los descobri um erro, um só. Não destruía o verso mas modificava
notavelmente seu sentido. Eu havia escrito: 'yacen la edad, el sueño y la
inocencia,' e o texto impresso dizia: “yacen, la edad, el sueño y la
inocencia,”. No dia seguinte vi Alí no Café Paris e lhe mostrei o corpo de
delito. Não se alterou e com 'um só sorriso' me respondeu: 'É um erro
afortunado. Melhora muito essa linha. Deverias estar muito contente: tens que
admitir que o azar é poeta às vezes'. Tive que concordar que ele tinha razão.
Mas não me decidi a aceitar aquele 'erro' e o soneto seguiu aparecendo em meus
livros de acordo com a versão original, claramente inferior. Minha resistência
não decorreu de um orgulho bobo, mas eu tinha 26 anos e me incomodava dizer que
eram ‘já idade’ o sonho e a inocência. Ademais, o verso imediatamente anterior
continha outro 'ya': 'Hechos ya tiempo muerto y exprimido'. Um dia, já faz
dezesseis anos, Marco Antonio Campos me telefonou e pediu-me umas páginas em
homenagem a Chumacero. Lembrei-me imediatamente do 'erro'. Não mais resisti à
tentação. O que não sabia era que a emenda desse verso me levaria a desmantelar
o segundo quarteto e o terceto final."
"A troca exigia a modificação do verso
precedente para evitar a repetição do 'já'. Não sem muitas dúvidas e intentos
inúteis, por fim escrevi os dois hendecassílabos [na métrica espanhola]:
'Resuelto al fin en fechas lo vivido / veo ya edad el sueño y la inocencia,'.
Eliminei ’yacen’, não só por razões de eufonía, mas por higiene mental. A mesma
razão me levou a trocar o quarto verso do mesmo quarteto, que me pareceu um
tremendo pastiche de Quevedo ('vana cifra del hombre y su gemido.'). O último
terceto tampouco me satisfazia inteiramente: 'Todo se desmorona o se congela: /
del hombre sólo queda su desierto, / monumento de yel, llanto, delito'. O
primeiro verso era inócuo; o segundo, mais próximo de Othón que de Quevedo,
indiferente, ainda que um pouco patético; o terceiro, abominável: um monumento
líquido, feito de substâncias como o fel e as lágrimas, coroado pelo emblema de
um delito abstrato? Mudei todo o terceto. Só restou do verso final, mas como
título do soneto, a palavra ‘monumento’."
III) Segunda versão, definitiva
Pequeno Monumento
Flui o tempo eterno e em sua pulsação
apenas vibra estéril insistência,
surda avidez de nada, negligência,
pulso de areia, azougue sem razão.
apenas vibra estéril insistência,
surda avidez de nada, negligência,
pulso de areia, azougue sem razão.
Fixado enfim em datas o vivido
Vejo esvaírem-se o sonho e a inocência,
punhado de aridez na consciência,
sílabas que disperso sem ruído.
Vejo esvaírem-se o sonho e a inocência,
punhado de aridez na consciência,
sílabas que disperso sem ruído.
Volvo o rosto: não sou senão parcela
de mim mesmo, a ausência que deserto,
o eco do silêncio de meu grito.
de mim mesmo, a ausência que deserto,
o eco do silêncio de meu grito.
Olhar que quando se olha se congela,
feixe de reflexos, aspecto incerto:
ao penetrar em mim me desabito.
feixe de reflexos, aspecto incerto:
ao penetrar em mim me desabito.
Pequeño Monumento
Fluye el tiempo inmortal y en su latido
sólo palpita estéril insistencia,
sorda avidez de nada, indiferencia,
pulso de arena, azogue sin sentido.
sólo palpita estéril insistencia,
sorda avidez de nada, indiferencia,
pulso de arena, azogue sin sentido.
Resuelto al fin en fechas lo vivido
veo ya edad el sueño y la inocencia,
puñado de aridez en mi conciencia,
sílabas que disperso sin rüido.
veo ya edad el sueño y la inocencia,
puñado de aridez en mi conciencia,
sílabas que disperso sin rüido.
Vuelvo el rostro: no soy sino la estela
de mí mismo, la ausencia que deserto,
el eco del silencio de mi grito.
de mí mismo, la ausencia que deserto,
el eco del silencio de mi grito.
Mirada que al mirarse se congela,
haz de reflejos, simulacro incierto:
al penetrar en mí me deshabito
haz de reflejos, simulacro incierto:
al penetrar en mí me deshabito