Mostrando postagens com marcador México: Octavio Paz (1914 – 1998) - Ouve-me como quem ouve chover / Óyeme como quien oye llover. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador México: Octavio Paz (1914 – 1998) - Ouve-me como quem ouve chover / Óyeme como quien oye llover. Mostrar todas as postagens

domingo, 22 de março de 2020

Octavio Paz (México: 1914 – 1998)



Ouve-me como quem ouve chover *


Ouve-me como quem ouve chover,
nem atenta nem distraída,
passos leves, garoa,
água que é ar,
ar que é tempo,
o dia não termina de ir-se,
não chega a noite ainda,
figuração da bruma
ao dobrar a esquina,
figurações do tempo
na curva desta pausa,
ouve-me como quem ouve chover.
Sem ouvir-me, ouvindo o que digo
com os olhos abertos para dentro,
adormecida com os cinco sentidos despertos,
chove, passos leves, rumor de sílabas,
ar e água, palavras que não pesam:
o que fomos e somos,
os dias e os anos, este instante,
tempo sem peso, pesar enorme,
ouve-me como quem ouve chover,
refulge o asfalto úmido,
o vapor se levanta e caminha,
a noite se abre e me olha,
és tu e teu talhe de vapor,
tu e teu rosto de noite,
tu e teu cabelo, relâmpago lento,
cruzas a rua e entras em minha fronte,
passos de água sobre minhas pálpebras,
ouve-me como quem ouve chover,
o asfalto refulge, tu cruzas a rua,
és a bruma errante na noite,
como quem ouve chover.
És a noite adormecida em tua cama,
és o fluxo das ondas de tua respiração,
teus dedos de água molham minha fronte,
teus dedos de chama queimam meus olhos,
teus dedos de ar abrem as pálpebras do tempo,
jorro de aparições e ressurreições,
ouve-me como quem ouve chover,
passam os anos, regressam os instantes,
ouves teus passos no quarto vizinho?
não aqui nem lá; ouve-os
em outro tempo que é agora mesmo,
ouve a chuva correr pelo terraço,
a noite já é mais noite no arvoredo,
nas folhagens aninhou-se o raio,
vago jardim à deriva
entra, tua sombra cobre esta página.


Óyeme como quien oye llover


Óyeme como quien oye llover,
ni atenta ni distraída,
pasos leves, llovizna,
agua que es aire,
aire que es tiempo,
el día no acaba de irse,
la noche no llega todavía,
figuraciones de la niebla
al doblar la esquina,
figuraciones del tiempo
en el recodo de esta pausa,
óyeme como quien oye llover.
Sin oírme, oyendo lo que digo
con los ojos abiertos hacia adentro,
dormida con los cinco sentidos despiertos,
llueve, pasos leves, rumor de sílabas,
aire y agua, palabras que no pesan:
lo que fuimos y somos,
los días y los años, este instante,
tiempo sin peso, pesadumbre enorme,
óyeme como quien oye llover,
relumbra el asfalto húmedo,
el vaho se levanta y camina,
la noche se abre y me mira,
eres tú y tu talle de vaho,
tú y tu cara de noche,
tú y tu pelo, lento relámpago,
cruzas la calle y entras en mi frente,
pasos de agua sobre mis párpados,
óyeme como quien oye llover,
el asfalto relumbra, tú cruzas la calle,
es la niebla errante en la noche,
como quien oye llover.
Es la noche dormida en tu cama,
es el oleaje de tu respiración,
tus dedos de agua mojan mi frente,
tus dedos de llama queman mis ojos,
tus dedos de aire abren los párpados del tiempo,
manar de apariciones y resurrecciones,
óyeme como quien oye llover,
pasan los años, regresan los instantes,
¿oyes tus pasos en el cuarto vecino?
no aquí ni allá: los oyes
en otro tiempo que es ahora mismo,
oye los pasos del tiempo
inventor de lugares sin peso ni sitio,
oye la lluvia correr por la terraza,
la noche ya es más noche en la arboleda,
en los follajes ha anidado el rayo,
vago jardín a la deriva
entra, tu sombra cubre esta página.



*) Em espanhol a expressão “como quien oye llover” denota pouco apreço ao que se ouve ou acontece. Equivale ao nosso “entrou por um ouvido e saiu pelo outro”.



Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)

  Argonautas   E se a alma deve conhecer-se a si mesma ela deve voltar os olhos para outra alma: * o estrangeiro e inimigo, vim...