Averno
– 3/18
Perséfone, a errante
Na primeira versão, Perséfone
é levada de sua mãe
e a deusa da terra
castiga a terra – o que é
coerente com o que sabemos da
conduta humana,
que os seres humanos sentem
profunda satisfação
em praticar o mal, em particular
o mal inconsciente:
chamemos a isso
criação negativa
A primeira estadia de
Perséfone no inferno continua a
ser
escarafunchada por acadêmicos que
debatem
as sensações da virgem:
será que ela facilitou seu
estupro,
ou foi drogada, violada contra sua
vontade,
como quase sempre acontece a
jovens de hoje.
Como bem sabido, a volta da amada
não repara
a perda da amada: Perséfone
volta para casa
manchada de seiva vermelha como
uma
personagem de Hawthorn –
Não estou certa se
guardarei esta palavra: a terra
é uma “casa” para Perséfone? É
concebível ela que esteja em casa,
na cama do deus? Em nenhum lugar
ela se sente em casa? Será que ela
é uma errante nata, em outra
palavras
uma réplica
existencial de sua própria mãe,
menos
tolhida por ideias de causalidade?
Você é livre para não
gostar de ninguém, você sabe.
Personagens
não são pessoas.
São aspectos de um dilema ou
conflito.
Três partes: assim como a alma é
dividida,
ego, superego, id. Da mesma forma
os três níveis do mundo conhecido,
uma espécie de esquema que separa
o céu da terra do inferno.
Você deve se perguntar:
onde está nevando?
Branco de esquecimento,
de profanação –
Está nevando sobre a terra; o
vento frio diz
Perséfone está fazendo sexo no
inferno.
Ao contrário de nós, ela não sabe
o que é inverno, apenas que
ela é quem o causa.
Está deitada na cama de Hades,
O que se passa em sua mente?
Está com medo? Alguma coisa
apagou a ideia
de mente?
Por certo ela sabe que a terra
é administrada por mães, isso é
mais
que seguro. Ela também sabe
que não é mais o que se chama
menina. Quanto
ao confinamento, ela acredita
que é prisioneira desde que é
filha.
Os terríveis reencontros que
aguardam por ela
se prolongarão pelo resto de sua
vida.
Quando a paixão pela expiação
é crônica, feroz, você não escolhe
o modo de viver. Você não vive;
você não tem licença para morrer.
Você vaga entre a terra e a morte
que guardam entre si, afinal,
estranha semelhança. Os estudiosos
dizem
que não faz sentido saber o que
você quer
quando as forças que em você
contendem
poderiam matá-lo.
Branco de esquecimento,
branco de segurança –
Dizem
que há uma fenda na alma humana
que ela não foi criada para
pertencer
inteiramente à vida. A terra
pede-nos para negar essa fenda,
uma ameaça
disfarçada de sugestão –
como vimos
na fábula de Perséfone
que deveria ser lida
como uma discussão entre a mãe e o
amante –
a filha é apenas carne.
Até que a morte a confronta, ela
nunca
vira o campo sem as margaridas.
De repente ela não mais canta
a beleza e a fecundidade
de sua mãe. Onde
a fenda se encontra, a fratura
está.
Canção da terra,
canção da visão mítica da vida
eterna –
Minha alma
despedaçada pelo esforço
de tentar ser parte da terra –
O que você fará
quando no campo for sua vez com o
deus?
Persephone
the Wanderer
In the
first version, Persephone
is
taken from her mother
and
the goddess of the earth
punishes
the earth—this is
consistent
with what we know of human behavior,
that
human beings take profound satisfaction
in
doing harm, particularly
unconscious
harm:
we may
call this
negative
creation.
Persephone's
initial
sojourn
in hell continues to be
pawed
over by scholars who dispute
the
sensations of the virgin:
did
she cooperate in her rape,
or was
she drugged, violated against her will,
as happens
so often now to modern girls.
As is
well known, the return of the beloved
does
not correct
the
loss of the beloved: Persephone
returns
home
stained
with red juice like
a
character in Hawthorne –
I am
not certain I will
keep
this word: is earth
"home"
to Persephone? Is she at home, conceivably,
in the
bed of the god? Is she
at
home nowhere? Is she
a born
wanderer, in other words
an
existential
replica
of her own mother, less
hamstrung
by ideas of causality?
You
are allowed to like
no
one, you know. The characters
are
not people.
They
are aspects of a dilemma or conflict.
Three
parts: just as the soul is divided,
ego,
superego, id. Likewise
the
three levels of the known world,
a kind
of diagram that separates
heaven
from earth from hell.
You
must ask yourself:
where
is it snowing?
White
of forgetfulness,
of
desecration –
It is
snowing on earth; the cold wind says
Persephone
is having sex in hell.
Unlike
the rest of us, she doesn't know
what
winter is, only that
she is
what causes it.
She is
lying in the bed of Hades.
What
is in her mind?
Is she
afraid? Has something
blotted
out the idea
of
mind?
She
does know the earth
is run
by mothers, this much
is
certain. She also knows
she is
not what is called
a girl
any longer. Regarding
incarceration,
she believes
she
has been a prisoner since she has been a daughter.
The
terrible reunions in store for her
will
take up the rest of her life.
When
the passion for expiation
is
chronic, fierce, you do not choose
the
way you live. You do not live;
you
are not allowed to die.
You
drift between earth and death
which
seem, finally,
strangely
alike. Scholars tell us
that
there is no point in knowing what you want
when
the forces contending over you
could
kill you.
White
of forgetfulness,
white
of safety –
They
say
there
is a rift in the human soul
which
was not constructed to belong
entirely
to life. Earth
asks
us to deny this rift, a threat
disguised
as suggestion—
as we
have seen
in the
tale of Persephone
which
should be read
as an
argument between the mother and the lover—
the
daughter is just meat.
When
death confronts her, she has never seen
the
meadow without the daisies.
Suddenly
she is no longer
singing
her maidenly songs
about
her mother's
beauty
and fecundity. Where
the
rift is, the break is.
Song
of the earth,
song
of the mythic vision of eternal life—
My
soul
shattered
with the strain
of
trying to belong to earth—
What
will you do,
when
it is your turn in the field with the god?