A casca contém uma potencial renovação poética. Aqui os ramos com pontas verdes soletram no céu as premissas de uma nova estação. Rapidamente o traçado abrupto e retilíneo dos ramos nus se engrossam, se turvam para desenhar formas aleatórias. As folhas que recobrem as árvores no verão cantarolam uma canção que abafa os galhos e o alfabeto que tracejam. Mas, para o poeta, o que conta acima de tudo é o que se encontra sob a folhagem, o corpo que se move graciosamente sob o tecido, a própria estrutura, exposta, desnuda, carnal e fértil: o poema. É por isso que a estrutura dos galhos é aqui comparada ao corpo de uma mulher sob suas roupas, "uma mulher / braços e pernas sob o tecido". O que interessa a Williams é o que está sob a folhagem, e a folhagem aí encontra seu duplo significado. Williams usa a mesma imagem que explica sua definição do romance em oposição ao poema. O poeta iconoclasta é encarregado de despir, desvelar. Esta é também a razão pela qual Williams evita as metáforas, sedas pomposas que vêm, segundo ele, para encobrir e sufocar a carne crua, como a casca do plátano. Esquematicamente, para Williams, o romance são as folhas; o poema, o tronco.
sábado, 14 de março de 2020
William Carlos Williams (Estados Unidos: 1883 – 1963)
A casca contém uma potencial renovação poética. Aqui os ramos com pontas verdes soletram no céu as premissas de uma nova estação. Rapidamente o traçado abrupto e retilíneo dos ramos nus se engrossam, se turvam para desenhar formas aleatórias. As folhas que recobrem as árvores no verão cantarolam uma canção que abafa os galhos e o alfabeto que tracejam. Mas, para o poeta, o que conta acima de tudo é o que se encontra sob a folhagem, o corpo que se move graciosamente sob o tecido, a própria estrutura, exposta, desnuda, carnal e fértil: o poema. É por isso que a estrutura dos galhos é aqui comparada ao corpo de uma mulher sob suas roupas, "uma mulher / braços e pernas sob o tecido". O que interessa a Williams é o que está sob a folhagem, e a folhagem aí encontra seu duplo significado. Williams usa a mesma imagem que explica sua definição do romance em oposição ao poema. O poeta iconoclasta é encarregado de despir, desvelar. Esta é também a razão pela qual Williams evita as metáforas, sedas pomposas que vêm, segundo ele, para encobrir e sufocar a carne crua, como a casca do plátano. Esquematicamente, para Williams, o romance são as folhas; o poema, o tronco.
sexta-feira, 13 de março de 2020
José Antonio Escalona-Escalona (Venezuela: 1917 – )
ilha de solidão reconquistada:
terra do coração em seu desterro,
residência do pranto perdurável.
o tempo é só um remanso sem fronteiras,
e o espaço um só hermético recinto
sob este céu sem luz nem movimento!
e as mais remotas músicas do mundo
teus limites escuros não transpõem.
só porque em sua entranha, prisioneiro,
ouço meu próprio coração clamante!
isla de soledad reconquistada:
tierra del corazón en el desierto,
residencia del llanto perdurable.
el tiempo es un remanso sin fronteras,
y el espacio un hermético recinto
bajo un cielo sin luz ni movimiento!
y las remotas músicas del mundo
tus límites oscuros no traspasan.
sólo porque en su entraña, prisionero,
oigo mi propio corazón clamante!
quinta-feira, 12 de março de 2020
Alfonso Reyes (México: 1889 – 1959)
A cada manhã volto a imaginá-lo
e a cada noite sei que desvario,
E meu segredo, à força de guardá-lo,
Morre sem ar e se entorpece ao frio.
Digo teu nome toda vez que falo,
e temo se ao dizê-lo me extravio,
Mudo afã, como não posso cantá-lo,
ao trinado dos pássaros o fio.
Sonho que o sol te expõe minha esperança,
e se nublado expõe minha tristeza,
e o recitar do vento a ti me lança.
Finalmente – a metáfora se cansa –,
e finjo então que toda a natureza
por mim te cerca e para mim te amansa.
Amor Vicario
Cada mañana vuelvo a imaginarlo
y cada noche sé que desvarío,
y mi secreto, a fuerza de guardarlo,
muere sin aire y se entumece al frio.
Voy a nombrarte cada vez que charlo,
y temo si el nombrarte es descarrío.
Mudo afán, como no puedo cantarlo,
al canto de los pájaros lo fío.
Sueño que el sol te dice mi esperanza,
el nublado te anuncia mi tristeza
y te recita el viento mi abalanza.
Y en suma - la metáfora se cansa -,
finjo que toda la naturaleza
por mí te asedia y para mí te amansa.
quarta-feira, 11 de março de 2020
Eduardo Carranza (Colômbia: 1913 – 1985)
por um bosque dourado ao meio-dia:
nascem jardins nas falas dos meus dias,
com minhas nuvens por teus sonhos ando.
Separa-nos e nos une um ar brando,
uma distância de melancolia;
alço os braços de minha poesia,
azul de ti, dorido e esperando.
És como um horizonte de flautins
ou um débil sofrimento de jasmins
pensar em ti, de azul temperamento.
O mundo me parece cristalino
E te miro, entre lâmpada de trino,
azul domingo de meu pensamento.
terça-feira, 10 de março de 2020
José Antonio Escalona-Escalona (Venezuela: 1917 – ?)
recebes-me.
E em teu absorto silêncio permaneço.
Tal atitude hierática do corpo
é aparente imagem. Mais lá no fundo
do coração
– tímpano da alegria
e de outros ritmos do sentir –
segue
sem pausa
o último concerto.
Porque o voo
de minha imaginação
em ilusórios giros me leva
sucessivamente
do imediato agora
ao passado
e traz-me de volta ao que é sonho ainda.
me recibes.
Y en tu absorto silencio permanezco.
Tal actitud hierática del cuerpo
es aparente imagen. Muy adentro
del corazón
– timbal de la alegría
y de otros ritmos del sentir –
sigue
sin pausa
el íntimo concierto.
Porque el vuelo
de mi imaginación
en ilusorios giros me lleva
sucesivamente
del inmediato ahora
a lo pasado
y vuelta a lo que es sueño todavía.
segunda-feira, 9 de março de 2020
Rodrigo Lira (Chile: 1949 – 1981)
Que há Cebolas para Ela na Prefeitura de Santiago.
As Cebolas são vistas através de umas janelas
Do pátio da Ilustre Prefeitura de Santiago.
Atrás das janelas do terceiro andar divisam-se
uns bebês em seus berços e pelas situadas mais abaixo
vê-se algo das Cebolas para a Gente Pobre.
Para vê-las é preciso chegar a um pátio
Ao pátio com duas Árvores bem verdes
Depois de passar ao lado de uma gaiola
Com uma caixa que sobe e desce
Depois de atravessar uma sala grande com piso de lajota e teto de vidro
Com umas senhoritas atrás do que parecem mostruários
Depois de subir umas escadas bem largas
Depois de passar por umas portas grandes
Na esquina de uma praça que se chama
'das Armas', na esquina do lado esquerdo
De uma estátua de um senhor a cavalo, de metal,
Com a espada grudada ao cavalo
Para que não seja roubada e cause dano.
Ali, sob as janelas com os bebês,
Estão as Cebolas.
Não sei se é possível conseguir
Um pouquinho delas.
O cavalheiro que manobra
O elevador, esse, com paredes gradeadas,
Disse-me que eram
para a gente pobre.
Depois, disse algo como Emprego Mínimo.
Eu tinha que sair logo e comprar um mapa de Santiago
e uma máquina de escrever.
Que hay Cebollas para Ella en la Municipalidad de Santiago.
Las Cebollas se ven asomadas a unas ventanas
Desde el patio de la I. Municipalidad de Santiago.
Tras las ventanas del tercer piso se divisan
Unas guaguas en sus cunas y por las que están un poco más abajo
Se ve algo de las Cebollas para la Gente Pobre.
Para verlas hay que llegar a un patio
Al patio con dos Arboles bien verdes
Después de pasar por el lado de una como jaula
Con una caja que sube y baja
Después de atravesar una sala grande con piso de baldosas
Y con tejado de vidrio
Con unas señoritas detrás de unos como mostradores
Después de subir unas escaleras bien anchas
Después de pasar unas puertas grandes
En la esquina de una plaza que se llama
'de Armas', en la esquina del lado izquierdo
De una estatua de un señor a caballo, de metal,
Con la espada apernada al caballo
Para que no se la roben y hagan daño.
Ahí, debajo de las ventanas con las guaguas,
Están las Cebollas.
No sé si podra conseguir
Unas poquitas.
El caballero que maneja
El ascensor ese, con paredes de reja.
Me dijo que eran
para la gente pobre.
Después, dijo algo del Empleo Mínimo.
Yo tenía que irme luego a comprar un plano de Santiago
y una máquina de escribir.
domingo, 8 de março de 2020
Rodrigo Lira (Chile: 1949 – 1981)
se desnuda.
Po
Poe
ta: o leitor de poesia
é o mais exigente inteligentíssimo
culto preparadíssimo!
A poesia não é para um qualquer e nenhum
qualquer escreve a óleo com o pincel
de Francis Bacon. Reconhece o limite de tuas
possibilidades. Limita-te ao aquarela,
em teus começos. Esboça, com
delicadeza. Filtra, coa,
depura. Explora teu veio
sem esterilizar tua mina.
.............................. O som está na
letra. A voz, escritor, é-lhe dada por
acréscimo.
.............................. Não recorta. Nada de piruetas
de Acrobata, riem de pirotecnia.
A torta de letras não precisa de creme
Não toca tua lira por moedas de ouro ou
bronze (Provérbio Japonês)
Haverás de levar em conta
o de sempre: a lua as flores a morte
a tristeza. A dupla circulação,
o incompreensível equilíbrio entre vômito
e estilo, as mulheres de palavra (A deusa),
as musas as figuras os recursos: o
de sempre, em odres outros. Medita
teus versos sete vezes, e teu verbo
quarenta vezes sete. Soma dois
mais dois: desconta
o IVA! (*)
el burro y la muerte
se desnuda
Po
Poe
ta: el lector de poesía
es el más exigente inteligentísimo
culto preparadísimo!
La poesía no es para cualquiera y no
cualquiera escribe al óleo con el pincel
de Francis Bacon. Reconoce el límite de tus
posibilidades. Limítate a la acuarela,
en tus comienzos. Abocetea, con
delicadeza. Filtra, tamiza,
depura. Explora tu veta
sin brocear tu mina.
.............................. El sonido está en
la letra. La voz, escritor, se te da por
añadidura.
.............................. No recortes. Nada de volteretas
de Volotinero, ríen de pirotecnia.
La torta de letras no precisa crema
No pulses tu lira por monedas de oro o
bronce (Proverbio Japonés)
Habrás de tomar en cuenta
lo de siempre: la luna las flores la muerte
la tristeza. La doble circulación,
el inasible equilibrio entre vómito
y estilo, las mujeres de palabra (La diosa),
las musas las figuras los recursos: lo
de siempre, en odres otros. Medita
tus versos siete veces, y tu verbo
cuarenta veces siete. Suma dos
más dos: descuenta
el IVA!
(*) IVA: Imposto sobre o valor acrescentado.
sábado, 7 de março de 2020
Enrique Linh Carrasco (Chile: 1929 – 1988)
sexta-feira, 6 de março de 2020
José Antonio Escalona-Escalona (Venezuela: 1917 – )
Por recobrar la soledad, mi espíritu
quinta-feira, 5 de março de 2020
Nicanor Parra (Chile: 1914 – 2018)
Fragmentos
Creio em um lugar + além
Pezinhos de menino
poesia poesia
Diga-me quais são para ti
Diga:
se vê que torturam alguém
os civis são gente uniformizada
Chile fértil província
Beije a bota que o pisoteia
Primeiro o Chile foi um país de gramáticos
"isso acontece comigo x crer em Deus"
As verdadeiras cores
Não matarás:
– Filho meu
Pássaros
Recuemos majestade!
Fragmentos
Creo en un + allá
Jorge Seferis (Grécia: 1900 – 1971)
Argonautas E se a alma deve conhecer-se a si mesma ela deve voltar os olhos para outra alma: * o estrangeiro e inimigo, vim...
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