Do livro Elogio da sombra – 14 / 31
Do
livro Elogio da sombra – 14 / 31
Rubayat
Volte do persa em minha voz
a métrica
A recordar que o tempo é diversa
Trama de sonhos ávidos que somos
E que o secreto Sonhador dispersa.
Volte a afirmar que o fogo é a cinza,
A carne o pó, o rio o passageiro
reflexo da tua e da minha vida
Que devagar dispersam-se ligeiros.
Volte a afirmar que o árduo monumento
Que erige a presunção é como o vento
Que passa, e que à luz inconcebível
Do Eterno, são cem anos um momento.
Volte a acautelar que o rouxinol de ouro
Canta por uma só vez no sonoro
Ponto excelso da noite, e que seus astros
Avaros não prodigam seu tesouro.
Volte a lua ao verso que tua mão
Escreve como volta no temporão
Azul a teu jardim. A mesma lua
Desse jardim buscar-te-á em vão.
Que sejam sob a lua das mais ternas
Tardes teu humilde exemplo essas cisternas,
Em cujo espelho d’água se repetem
Umas poucas imagens sempiternas.
E que a lua do persa e os imprecisos
dourados dos crepúsculos desertos
Voltem. Hoje é ontem. És os outros
Cujo semblante é pó. Tu és os mortos.
Rubaiyat
Torne en mi voz la métrica del persa
A recordar
que el tiempo es la diversa
Trama de
sueños ávidos que somos
Y que el secreto
Soñador dispersa.
Torne a
afirmar que el fuego es la ceniza,
La carne el
polvo, el río la huidiza
Imagen de tu
vida y de mi vida
Que
lentamente se nos va de prisa.
Torne a
afirmar que el arduo monumento
Que erige la
soberbia es como el viento
Que pasa, y
que a la luz inconcebible
de Quien
perdura, un siglo es un momento.
Torne a
advertir que el ruiseñor de oro
Canta una
sola vez en el sonoro
Ápice de la
noche y que los astros
Avaros no
prodigan su tesoro.
Torne la luna
al verso que tu mano
Escribe como
torna en el temprano
Azul a tu
jardín. La misma luna
De ese jardín
te ha de buscar en vano.
Sean bajo la
luna de las tiernas
Tardes tu
humilde ejemplo las cisternas,
En cuyo
espejo de agua se repiten
Unas pocas
imágenes eternas.
Que la luna
del persa y los inciertos
Oros de los
crepúsculos desiertos
Vuelvan. Hoy
es ayer. Eres los otros
Cuyo rostro
es el polvo. Eres los muertos.
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