sexta-feira, 5 de junho de 2020

Eugenio Montejo (Venezuela: 1938 – 2008)



Sobremesa


Às cegas, ao fundo da névoa
que cai de remotos dias,
tornamos a nos sentar
e falamos já sem nos vermos.
Às cegas, ao fundo da névoa.

Sobre a mesa volta o ar
e o sonho atrai os ausentes.
Pães em que hibernaram musgos frios
sobre a toalha despertam agora.

Vagueiam vapores de café
e no aroma, reavivados,
vemos pairar antigos rostos
que embaçam os espelhos.

Retas cadeiras vazias
aguardam os que, desde longe,
retornarão mais tarde. Começamos a falar
sem nos vermos e alheios ao tempo. 

Às cegas, na varanda
que cresce e nos envolve,
conversamos por horas sem perceber
quem vive ainda, quem está morto.


Sobremesa


A tientas, al fondo de la niebla
que cae de los remotos días,
volvemos a sentarnos
y hablamos ya sin vernos.
A tientas, al fondo de la niebla.

Sobre la mesa vuelve el aire
y el sueño atrae a los ausentes.
Panes donde invernaron musgos fríos
en el mantel ahora se despiertan.

Yerran vapores de café
y en el aroma, reavivados,
vemos flotar antiguos rostros
que empañan los espejos.

Rectas sillas vacías
aguardan a quienes, desde lejos,
retornarán más tarde. Comenzamos a hablar
sin vernos y sin tiempo.

A tientas, en la vaharada
que crece y nos envuelve,
charlamos horas sin saber
quién vive todavía, quién está muerto.



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