segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Leonel Alvarado (Honduras: 1967 – )

 

Uma das melhores fotos do ano

 

Não te amo muito, amor.

Pedro Salinas

 

Agora te amo muito menos, San Pedro Sula.

E é por essa garota que deixaste de amar

à uma da manhã. É o que diz o laudo,

que a deixaste sair de uma festa e com três balas

disseste-lhe que não mais a amava.

 

Caiu de joelhos, como se houvesse suplicado,

disse o fotógrafo da Reuters. Das três balas

a única visível é a das costas: uma mancha

negra em sua blusa amarela. Não há mais luz na rua,

apenas essa blusa iluminada pelo flash.

 

Por um momento, diz a nota, esteve rodeada

de fotógrafos. Mas depois soaram os celulares:

longe dali a cidade havia deixado de amar

a outra garota que talvez também vinha de uma festa

e que talvez também havia suplicado.

 

Não tiveste mais tempo para amar a garota

da blusa amarela. Deixaste-a só, por isso

amo-te menos, cidade, por essa mancha brutal

nas costas, por essa súplica que não ouviste.

 

Como ia saber, essa garota, que ao sair da festa

sua última foto estaria, segundo a Reuters, entre as vinte

fotografias do ano [1]. O jornal se dá ao incômodo

de advertir seus leitores que entre as vinte fotos

selecionadas está a de um cadáver. É o teu, cidade,

ainda que o queiras menos; não me venhas com a conversa

de que estavas ocupada em desamar outra garota.

 

Um policial ficou com a garota, assim termina a nota,

enquanto chegava o legista. Segues nessa rua escura,

cidade, esperando que venham examinar tua blusa,

desdobrar teu corpo imobilizado em súplica, citar teu cadáver

e dar a ti um número que já não podes contestar.

 

 

Una de las mejores fotos del año

 

No te quiero mucho, amor.

Pedro Salinas

 

Ahora te quiero mucho menos, San Pedro Sula.

Y es por esa muchacha que dejaste de querer

a la una de la mañana. Es lo que dice el parte,

que la dejaste salir de una fiesta y con tres balas

le dijiste que no la querías más.

 

Quedó de rodillas, como si hubiera suplicado,

dice el fotógrafo de Reuters. De las tres balas

la única visible es la de la espalda: una mancha

negra en su blusa amarilla. No hay más luz en la calle,

sólo esa blusa iluminada por el flash.

 

Por un momento, dice la nota, estuvo rodeada

de fotógrafos. Pero después sonaron los celulares:

lejos de allí la ciudad había dejado de querer

a otra muchacha que quizá también venía de una fiesta

y que quizá también había suplicado.

 

No hubo más tiempo para querer a la muchacha

de la blusa amarilla. La dejaste sola y por eso

te quiero menos, ciudad, por esa mancha brutal

en la espalda, por esa súplica que no atendiste.

 

Cómo iba a saber esa muchacha que al salir de la fiesta

su última foto estaría, según Reuters, entre las veinte

fotografías del año. El periódico se toma la molestia

de advertir a sus lectores que entre las veinte fotos

seleccionadas hay una de un cadáver. Es el tuyo, ciudad,

aunque lo quieras menos; no me vengas con el cuento

de que estabas ocupada en desquerer a otra muchacha.

 

Un policía se quedó con la muchacha, termina la nota,

mientras llegaba el forense. Sigues en esa calle oscura,

ciudad, esperando que vengan a examinar tu blusa,

desdoblar tu cuerpo anudado en súplica, nombrar tu cadáver

y llamarte a un número que ya no puedes contestar.

 

[1]  https://www.theguardian.com/theobserver/gallery/2013/dec/28/observer-20-photos-of-the-year


 

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